União Estável é a “mesma coisa” que casamento?

Marcelo da Rosa e Silva – Advogado (OAB/SC – 35.931)

Frequentemente, na minha “sina” de advogar, quando em algum atendimento a cliente, ou mesmo em rodas de bate-papos, me deparei com essa visão, vinda de pessoas leigas e obviamente mal informadas, de que união estável e casamento é a “mesma coisa”, pois os direitos (em caso de separação/dissolução) seriam os mesmos…

Nada mais equivocado!

Quando escutava esta declaração, imediatamente me apressava em desfazer este terrível equívoco, certamente provocado pela desinformação, ou pela informação mal interpretada, ou mesmo pela “rádio janela”, tão comum ainda hoje e até mesmo alavancada pelo mau uso das redes sociais e aplicativos de mensagens instantâneas, que propagam à velocidade da luz toda sorte de informações sem qualquer checagem de sua autenticidade, veracidade, autoria, ou mesmo do impacto negativo que podem provocar nas pessoas que as recebem.

  • O reconhecimento da união estável na Constituição de 1988 e no Novo Código Civil:

Primeiramente, é importante frisar que muito embora o relacionamento entre duas pessoas, por assim dizer, informal, que tivesse feições de família sequer era reconhecido no direito brasileiro até o advento da Constituição Federal de 1988, uma vez que o Código Civil de 1916 tratava o caso como concubinato, quer seja o concubinato adulterino, como o “companheirismo”, que era a relação fática, porém informal de um casal.

Com a promulgação da Constituição de 1988, que em seu parágrafo 3º do artigo 226 estabeleceu: “§ 3º. Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”

Um pouco depois, em 2003, com a publicação do “Novo” Código Civil (sancionado com 30 anos de atraso), surge o artigo 1.723, que preceitua: ““é reconhecida como entidade familiar a união estável entre homem e mulher, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento, configurada pela convivência pública, contínua e duradoura estabelecida com o objetivo de constituição de família”.

Assim, não apenas o reconhecimento, como também o termo “União Estável” passou a ser utilizado em detrimento do inadequado “concubinato puro”, ou “casamento de fato”, utilizado pelos doutrinadores pré-constituintes, ou também “companheirismo”, frequentemente empregado em matéria previdenciária e trabalhista.

  • Dificuldade em fazer prova da união estável informal:

Porém, como tudo no Brasil anda a passos de tartaruga, ainda que a Constituição tivesse equiparado a união estável ao casamento, em razão da falta de especificidade acerca da forma como se daria tal reconhecimento, uma série de empecilhos passaram a ser criados para o reconhecimento da relação, obrigando os “companheiros” a fazerem provas muitas vezes leoninas da convivência que mantinham para que pudessem obter o enquadramento legal.

  • Prova da união estável no direito de família e direito previdenciário:

Especialmente no que diz respeito à dissolução de uma união estável informal (aquela que ocorre de fato, sem a celebração de um contrato, ou escritura pública), quando havia bens a serem divididos, os obstáculos tendiam (e ainda tendem) a prejudicar mais à mulher do que o homem da relação, haja vista que ainda prevalece no Brasil o empoeirado papel de “provedor” ao homem, enquanto a mulher ainda é vista como “do lar”, de tal forma que boa parte, senão a totalidade dos bens amealhados pelo casal é adquirida em nome do companheiro, dificultando à mulher fazer prova da aquisição para fins de divisão.

No campo previdenciário, outra enorme trincheira se abre, a dificultar a concessão de benefícios previdenciários ao beneficiário (ou beneficiária) de pessoa que contribui com o INSS…

Se você que está lendo este artigo pertence ao grupo que pensa que a lei garante a pessoas que convivem em união estável os mesmos direitos que pessoas casadas, talvez você esteja certo… Porém, conferir os mesmos direitos não significa exigir as mesmas provas para consolidar tais direitos.

Tomemos como exemplo o benefício de Pensão por Morte, concedido pelo INSS aos dependentes de segurado falecido. Se o casal tinha filhos, a estes basta a apresentação de certidão de nascimento, e uns poucos documentos mais que comprovem ainda serem beneficiários da pensão para que a obtenham. Se o(a) cônjuge sobrevivente era casado com o falecido, basta a apresentação de documentos pessoais, CERTIDÃO DE CASAMENTO e certidão de óbito do(a) falecido(a). Se, contudo, o casal convivia em união estável, inicia-se para o(a) consorte sobrevivente um verdadeiro calvário de (literalmente) provações intermináveis, que vão desde a apresentação de todo tipo de documento capaz de comprovar a relação, como apresentação de testemunhas.

De fato, a informalidade da convivência em união estável da maioria dos casais que adotaram este tipo de relacionamento dificulta muito ao cônjuge sobrevivente fazer prova da relação nos termos estipulados pelo INSS, que exige desde contrato de aluguel, extrato de conta bancária, notas fiscais de compra de produtos, faturas de consumo, etc, para reconhecer a relação havida como união estável e conceder o benefício, não sendo raros os casos em que a obtenção da benesse somente venha pela sentença de um juiz, haja vista que não é incomum o indeferimento administrativo em todas as instâncias.

O pior de tudo, é que as pessoas que optam pela modalidade “informal” de convivência em união estável o fazem, muitas vezes, por ignorância destes e outros fatores.

  • Facilidade de formalizar um relacionamento com fins de constituição de família:

Um deles é que é absolutamente rápido e descomplicado formalizar uma relação com intuito de formação de família, quer seja através de um instrumento particular, quer seja por meio de uma escritura pública.

Um contrato particular de união estável, no qual estejam dispostos os termos mínimos necessários, tais como o regime de bens a ser adotado pelo casal (comunhão parcial de bens, comunhão universal de bens, ou separação de bens), já minimiza muito a dor de cabeça em casos de eventual dissolução da união, ou para obtenção de algum benefício previdenciário (uma escritura pública de união estável auxilia mais nesse aspecto, perante o INSS).

Por outro lado, a diferença de custos entre a celebração de uma escritura de união estável e uma certidão de casamento é tão pequena que merece ser refletido pelo casal se não vale a pena celebrar logo o casamento civil, uma vez que para desfazer uma ou outra forma de relacionamento (seja pela dissolução, ou pelo divórcio), os empecilhos, desgostos, sofrimentos e custos são rigorosamente os mesmos.

Desta forma, se já convive informalmente em união estável, ou está pretendendo “juntar as escovas de dentes”, considere fazer isto de forma a evitar futuros transtornos e viva sua relação de forma clara e aberta, sabendo de antemão seus direitos, assim como garantindo que não levará meses, ou até mesmo anos, para obter um benefício previdenciário, ao qual sempre teve direito, mas não pôde produzir provas suficientes para obtê-lo.

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2 comentários em “União Estável é a “mesma coisa” que casamento?”

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